Murakami Haruki é o autor contemporâneo que mais gosto e que trabalha um tema que eu sempre quis pesquisar e entender, mesmo que em apenas alguns aspectos: a mentalidade japonesa.

Underground é o livro q estou lendo no momento e um dos mais impresionantes do autor, principalmente por tratar de um acontecimento real, em que a imaginação do autor é posta de lado para dar lugar a uma análise quase clínica dos entrevistados e seus relatos.

Poucos brasileiros se lembram do atentado arquitetado pelos membros da seita Aum Shinrikyo em 20 de março de 1995, que daqui a 10 dias completará 16 anos. Eu lembro de ter visto noticias na tv e nos jornais mas há 16 anos atrás e não tinha noção da amplitude desse atentado. Foi noticiado aqui no Brasil da mesma forma q os atentados em madri e londres foram anunciados anos depois, assim como diversas tragédias internacionais são exibidas dia após dia pelos meios de comunicação. Mas na minha humilde opinião existe uma diferença gigantesca entre os atentados terroristas ocorridos nas cidades europérias, muitas vezes ligados a grupos fundamentalistas islâmicos ou grupos separatistas e o atentado de Tokyo, em 1995. A principal diferença reside na questão do TERROR. O ataque no metrô de Tokyo não foi um ataque terrorista como foram os outros porque não existiu o terror, o pânico e a certeza imediata de que se tratava de uma tragédia como ocorreu nas outras metrópoles. Murakami retrata com clareza a calma com que as pessoas saiam dos vagões, mesmo com dores e dificuldades na respirção e visão, após os anuncios de encerramentos das atividades dos comboios atingidos devido a anomalidades não bem explicadas.

Não havia fogo, não havia explosão, sangue, ferimentos abertos, destruição. Apenas alguns pacotes enrolados em jornais que derramavam um liquido de cheiro estranho. E depois, pessoas q subitamente se sentiam mal, desmaiavam, perdiam a visão. Era o Sarin.

Os trens no Japão são extremamente pontuais e essa pontualidade é o grande motivo de orgulho dos funcionários das linhas férreas. Sob tokyo existe uma extensa malha ferroviária, bastante complexa para quem está habituado as ineficientes três principais linhas de metrô de São Paulo. É possivel ir a todo lugar utilizando apenas as linhas de metrô e trem em tokyo e esse é o principal meio de locomoção da maior parte da população
mapa das linhas

No horário de pico da manhã, no qual aconteceu o atentado, assim como no resto do dia, o silêncio reina nos vagões, seja com passageiros espremidos entre as portas ou confortavelmente sentados. Dentro da cultura japonesa há o nós chamados de meiwaku, incômodo, e faz parte do senso comum evitar ser ou se tornar um incômodo às outras pessoas, conhecidas ou não. O Sarin é, dessa forma, muito mais eficaz dentro dessa sociedade do que em sociedades ocidetais em que a comunicação é livre nesse tipo de transporte e as pessoas tendem a se expressar mais.
Em geral, se as vítimas do sarin tivessem reagido logo que os primeiros sintomas se manifestaram, o estado delas seria bem menos grave. No entando, a maioria dos entrevistados por Murakami, a sentirem os primeiros sintomas logo os associaram ao cansaço por excesso de trabalho, noites mal dormidas e relutaram em procurar ajuda antes que os sintomas se tornassem realmente sérios. Muitos, mesmo se sentindo extremamente mal e vendo que outras pessoas também se sentiam mal não conseguiam fazer a ligação entre os proprios problemas e os das outras pessoas, sentadas, desmaiadas, desnorteadas. "Isso não tem nada a ver comigo". Em muitos casos não houve uma percepção de que algo havia acontecido que estava a afetar seriamente a saúde das pessoas. Os trabalhadores muitas vezes chegaram ao seus escritorios, participaram das reuniões matinais e ao se sentirem extremamente mal foram orientados a procurar ajuda médaia, alguns sem nem mesmo saber do ocorrido no metrô, do qual fizeram parte.
Esses casos, logicamente, foram os das pessoas menos afetadas, que passaram por perto do sarin, inalaram alguma quantidade do gás mas não estavam no centro da ação. No total 12 pessoas morreram, outras ainda se encontram em estado vegetativo e essas vítimas mais graves encontravam-se no local onde o gás foi liberado ou então manipularam os sacos com sarin, como no caso do funcionário do metrô que, cumprindo o seu dever, foi limpar o liquido do vagão em Kasumigaseki.

No Brasil, se uma pesso apassa mal no metrô ou outro lugar público ela primeiramente procura por ajuda, inclusive das pessoas desconhecidas ao se redor. Os japoneses não. Se aqui vemos uma pessoa passar mal, oferecemos ajuda, os japoneses muitas vezes pensam "não tem nada a ver comigo", "não posso me atrasar" e esperam que outra pessoa possa ajuda-la, talvez alguma autoridade ou funcionário. Se diversas pessoas se sentissem mal ao mesmo tempo no metrô aqui, as pessoas logo reclamariam e buscariam ajuda, assim como a causa do mal estar. No Japão não.
O Japaõ é um país seguro, um dos mais seguros do mundo, logo quem pode culpar os japoneses por eles não conseguirem de forma alguma imaginar que um mal-estar estaria relacionado a um ataque criminoso? Aqui no Brasil se algo está errado, logo imaginamos que existe alguma ação criminosa por trás, sequestradores, traficantes, o que for... Então, o fato dos brasileiros estarem acostumados a ações criminosas e infortúnios nos faz mais preparados que os japoneses para entrentar situações extremas como essa do ataque ao metrô de tokyo? Nós brasileiros somos mais solidários uns com os outros porque precisamos mais? Seria cômico se não fosse trágico, mas vendo por essa perspectiva até que faz sentido, não?

Muitas foram as criticas ao governo japonês, por ele não ter um sistema unificado de ação em situações de emergência como essa, mas de fato ninguém imaginava que pudesse acontecer. Sarin não é um gás facil de ser produzido e comercializado, é extremamente letal. Explosões podem ser provocadas de diversas formas, ataques com armas químicas não. Ninguém sabia do que se tratava e muito menos como reagir...

Agora, 16 anos depois, será os japoneses saberiam como enfrentar essa stuação? Aprenderam alguma coisa? E nós, o resto do mundo, aprendemos alguma coisa?

Não entrei no livro propriamente dito aqui, na questão das entrevistas e métodos utilizados pelo autos,, ainda não li a parte final, mas essas são as minhas considerações sobre o acontecimento, que conheci melhor agora com o livro. Os comentários sobre o livro em si ficam pro próximo post. ok?